Como identificar se uma ação está supervalorizada ou subvalorizada?

Descubra como avaliar e identificar se uma ação atingiu extremos de alta ou baixa e tome decisões mais assertivas no mercado financeiro.

As ações da rede de farmácias Raia Drogasil fecharam o dia 5 de junho de 2020 cotadas a R$ 111, enquanto os papéis da Cielo, empresa de serviços financeiros, encerraram a mesma data valendo R$ 4,50. Esses valores representavam, respectivamente, os maiores e menores preços nominais entre as ações do Ibovespa, o principal índice da bolsa brasileira, a B3. Mas será que é correto afirmar que a Cielo é “mais barata” que a Raia Drogasil? Ou que um papel da rede de farmácias “vale” quase 25 vezes mais que o da adquirente?

Enquanto isso, ações de empresas como Ambev e Itaú Unibanco apresentaram uma desvalorização nominal semelhante em 2020: 24,5% e 24,3%, respectivamente. Mas qual dessas ações, de fato, perdeu mais valor real? E mais intrigante ainda: é possível determinar se alguma delas sofreu uma queda excessiva?

Essas questões, embora aparentemente simples, demandam uma análise mais profunda. Investidores experientes sabem que não se tratam apenas de perguntas semânticas. Há mais de uma resposta possível para cada uma delas, e nem sempre existe uma resposta absolutamente certa ou errada.

Analistas, investidores e gestores enfrentam esses dilemas diariamente, especialmente em um cenário desafiador como o atual. Com uma pandemia sem precedentes causando retração econômica global e uma grave crise política no Brasil, a tarefa de identificar quais ações são mais.

Como Avaliar o Desempenho de uma Ação?

A recente queda generalizada nas bolsas de valores trouxe consigo uma correção de alguns “exageros” do mercado. “Já no final de 2019, era evidente que certos papéis estavam sendo negociados por valores insustentáveis”, afirma um especialista. Essa percepção é obtida por meio da análise dos chamados múltiplos, que relacionam indicadores financeiros das empresas ao preço de suas ações.

Em outras palavras, os múltiplos permitem decifrar as nuances do desempenho de uma ação. Essa análise, parte fundamental da abordagem fundamentalista, vai além de simples comparações de preços nominais ou do desempenho das ações em relação ao Ibovespa.

Para exemplificar, foram utilizados três múltiplos para analisar o comportamento das ações durante a fase mais intensa de queda da bolsa brasileira e o início da recuperação. O período analisado vai de 29 de fevereiro, antes do colapso do Ibovespa, até 18 de maio, quando teve início um rally na B3. Confira os insights práticos a seguir.

Preço sobre Valor Patrimonial: Como Saber se uma Ação Está “Cara” ou “Barata”?

A relação entre o preço e o valor patrimonial de uma ação é uma ferramenta útil para avaliar se uma empresa está sobrevalorizada ou subvalorizada na bolsa. Esse múltiplo é calculado dividindo-se o preço nominal da ação pelo valor patrimonial por ação, que é obtido ao dividir o patrimônio líquido da empresa pela quantidade de ações emitidas.

De forma simples, se esse múltiplo está próximo de 1, a ação é negociada em linha com o valor patrimonial da companhia. Um múltiplo acima de 1 pode indicar que o mercado está disposto a pagar mais pela ação do que seu patrimônio líquido sugere. No entanto, quando o valor é excessivamente alto, pode refletir otimismo exagerado dos investidores.

Entre 29 de fevereiro e 18 de maio de 2020, durante a crise da pandemia, o múltiplo preço/valor patrimonial de empresas de consumo listadas na B3 caiu de 4,8 para 2,7. Essa redução reflete uma revisão nas expectativas de desempenho dessas companhias diante do cenário de retração econômica.

Por outro lado, quedas muito acentuadas podem indicar oportunidades. A Cogna Educação, por exemplo, viu seu múltiplo preço/valor patrimonial cair de 1 para 0,5 no mesmo período. Logo após, as ações da empresa registraram uma alta superior a 48%, sugerindo que o mercado pode ter revisado o pessimismo em relação à companhia.

Valor da Empresa sobre Ebitda: Avaliação Operacional em Cenários de Crise

O Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações) mede a capacidade de uma empresa gerar caixa com sua atividade principal. O múltiplo valor da empresa/Ebitda ajuda a entender se as operações de uma companhia estão saudáveis. Se o múltiplo mantém estabilidade em tempos de crise, é sinal de que a empresa preserva desempenho operacional sólido.

Setores como energia e saneamento básico costumam apresentar menores oscilações nesse índice, devido a contratos de longo prazo e previsibilidade de receita. Um exemplo é a Cemig, cujo múltiplo caiu suavemente de 8,4 para 7,7 entre fevereiro e maio de 2020, mesmo em um cenário de crise intensa. A transmissora Taesa registrou uma queda similar, de 10,9 para 8,8 no mesmo período.

Preço sobre Lucro: Perdas que Podem se Tornar Oportunidades

O múltiplo preço/lucro (P/L) mostra quanto os investidores estão dispostos a pagar pelo lucro de uma empresa. Um P/L baixo pode refletir ceticismo do mercado, mas também sinalizar potencial de valorização caso os investidores estejam subestimando a companhia.

Entre fevereiro e maio de 2020, o índice preço/lucro do Banco do Brasil caiu de 7,2 para 4,4, refletindo preocupações sobre os impactos da crise política e o aumento do risco de inadimplência. Nesse caso, as ações precisariam oferecer um desconto significativo para continuar atraentes, abrindo espaço para uma possível valorização futura.

A Importância da Diversificação e Cautela

Nenhum múltiplo isolado conta toda a história de uma empresa. Avaliar diferentes índices é essencial, considerando que todos os investidores estão observando os mesmos números. Por isso, uma regra fundamental permanece válida: diversificar o portfólio e evitar concentrar todos os recursos em um único papel ou setor.

Na renda variável, a cautela continua sendo o principal guia para decisões bem fundamentadas.